Soneto de Natal— Pedro de Almendra
Jan 11, 2021
Não te vás enganar co essa criança
que agora dorme fundo entre os carinhos
da palha avermelhada (sangue e espinho)
e do amor de sua mãe que, numa manta
suave, lhe vai rápido abrigando.
Não te envolvas tranquilo nesse sonho,
porque se a melodia do seu ronco
for súbito rompida, e se em pranto
ele desperta, e range suas gengivas,
é o mundo que esperneia em suas braçadas.
Olhai-o tremer, lede seu suspiro;
em cada gesto há verbo e substantivo;
profecia entre lágrima e golfada:
“não vim trazer a paz; eu trouxe a espada”.
(Pedro de Almendra)